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A Nova Tributação sobre Locação e Venda de Imóveis por Pessoas Físicas: Desafios e Estratégias após a Reforma Tributária

  • Foto do escritor: João Paulo Goulart Clementino
    João Paulo Goulart Clementino
  • 22 de out.
  • 5 min de leitura

1. Um novo capítulo na tributação imobiliária


A reforma tributária de 2025, implementada pela Lei Complementar nº 214, redesenhou as bases da tributação sobre bens e serviços no Brasil. Dentre as diversas mudanças, uma das mais impactantes recai sobre as operações de locação e venda de imóveis realizadas por pessoas físicas — que passam, em determinadas situações, a ser alcançadas pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).


Tradicionalmente, o aluguel e a alienação de imóveis estavam fora do campo dos tributos sobre consumo. O ISS não incidia sobre a locação, e a venda de imóveis era tributada apenas pelo ITBI, quando envolvia transferência onerosa de propriedade. Com o novo modelo do IVA dual (IBS + CBS), a legislação ampliou o alcance da tributação, incluindo também operações envolvendo bens materiais e direitos — o que abrange, expressamente, atividades imobiliárias desenvolvidas de forma habitual.


Essa mudança afeta diretamente investidores, empreendedores e gestores patrimoniais, que precisarão reavaliar suas estruturas e estratégias de atuação no mercado imobiliário para evitar surpresas fiscais e otimizar a carga tributária.


2. Quando a pessoa física passa a ser tratada como contribuinte de IBS e CBS


A LC nº 214/2025 estabelece critérios objetivos para definir quando uma pessoa física passa a ser considerada contribuinte regular desses novos tributos. Em linhas gerais, o enquadramento depende da dimensão e da frequência das operações realizadas, levando em conta tanto o volume de receitas obtidas quanto o número de imóveis envolvidos.


Locação de imóveis


A pessoa física que obtiver receitas anuais de aluguel superiores a R$ 240 mil e alugar mais de três imóveis simultaneamente será considerada contribuinte dos tributos sobre bens e serviços. Ambos os critérios precisam estar presentes para que a obrigação surja.


O limite de R$ 240 mil — que corresponde a uma média mensal de R$ 20 mil — será corrigido mensalmente pelo IPCA, conforme determinação expressa da própria lei. Essa atualização automática demonstra a intenção do legislador de manter o parâmetro ajustado à inflação e à realidade de mercado.


Em termos práticos, o novo enquadramento significa que a locação, antes considerada apenas como uma forma de renda patrimonial, passa a ser vista como uma atividade econômica, quando exercida em escala relevante ou de forma sistemática.


Venda de imóveis


Já nas operações de venda, a lei define que a pessoa física que vender mais de três imóveis em um mesmo ano passa a ser tratada como contribuinte de IBS e CBS, independentemente do valor envolvido.


Contudo, há uma limitação temporal importante: apenas os imóveis que tenham sido adquiridos há menos de cinco anos entram nesse cômputo. A intenção é diferenciar as vendas ocasionais — típicas de reorganizações patrimoniais — das atividades de revenda ou incorporação que revelem caráter empresarial.


No caso de imóveis construídos pelo próprio titular, o tratamento é ainda mais rigoroso: se o contribuinte construir e vender mais de um imóvel em período inferior a cinco anos, também será alcançado pela tributação. O entendimento é de que essa prática caracteriza atividade produtiva, e não mera administração de patrimônio.


3. Operações realizadas no próprio ano e a habitualidade da atividade


Além da análise histórica, a legislação também considera a situação no próprio exercício em curso.Ou seja, se durante o ano a receita proveniente de locações ultrapassar R$ 288 mil — valor equivalente a 20% acima do limite de referência —, a pessoa física passa a ser automaticamente enquadrada como contribuinte, mesmo que não tenha alugado mais de três imóveis.


Da mesma forma, a venda de mais de três unidades dentro do mesmo ano, ou a comercialização de mais de um imóvel construído pelo próprio titular, são suficientes para que a operação passe a ser tributada.


Essa análise reforça a lógica de que o critério relevante não é apenas o volume financeiro, mas também a habitualidade e a natureza econômica da operação. A reforma, portanto, aproxima a tributação das pessoas físicas que atuam no setor imobiliário da lógica empresarial aplicada às pessoas jurídicas.


4. O aluguel por temporada e a equiparação ao setor hoteleiro


Um dos pontos mais sensíveis da nova legislação é a equiparação da locação por curta temporada — aquela com duração de até 90 dias — aos serviços de hospedagem.


Pelo texto da LC nº 214, o aluguel temporário de imóveis residenciais será tratado da mesma forma que o serviço hoteleiro, sujeitando o locador pessoa física ao IBS e à CBS, independentemente da quantidade de imóveis ou do valor obtido.


Essa regra atinge diretamente os proprietários que utilizam plataformas digitais de hospedagem, como Airbnb e congêneres, consolidando a tendência de formalização e tributação da economia compartilhada. A habitualidade no aluguel de curta duração passa, portanto, a ter tratamento tributário similar ao das empresas do setor de turismo e hospedagem.


5. Reflexos econômicos e estratégias de gestão patrimonial


As mudanças trazidas pela reforma tributária exigem das pessoas físicas uma nova forma de organizar e administrar seus ativos imobiliários. O impacto não é apenas fiscal, mas também estratégico e operacional.


Empresários e investidores precisam avaliar se a manutenção dos imóveis em nome pessoal continua sendo a opção mais vantajosa, ou se é o momento de estruturar uma holding patrimonial.


A constituição de uma pessoa jurídica específica para centralizar as operações imobiliárias pode oferecer vantagens como:


  • Melhor controle contábil e fiscal das receitas e despesas;

  • Aproveitamento de créditos de IBS e CBS sobre aquisições e serviços relacionados à atividade;

  • Facilidade na gestão sucessória e patrimonial, reduzindo riscos e burocracias futuras.


Contudo, essa decisão deve ser precedida de um planejamento jurídico e tributário detalhado, levando em conta o perfil de cada operação, o número de imóveis envolvidos e os objetivos do investidor.


Além disso, torna-se indispensável manter registros organizados e atualizados, tanto para comprovar a origem e a natureza das receitas quanto para demonstrar que a atividade não ultrapassa os limites que caracterizam a incidência do IBS e da CBS.


A falta de documentação adequada pode levar a autuações e penalidades, especialmente em um cenário em que a Receita Federal tende a intensificar o cruzamento de dados patrimoniais e financeiros.


6. O papel da assessoria jurídica preventiva


Em um contexto de complexidade crescente, o apoio de profissionais especializados torna-se essencial. A assessoria jurídica preventiva permite avaliar previamente o enquadramento tributário de cada operação e identificar oportunidades legais de otimização fiscal.


O acompanhamento próximo de advogados tributaristas e contadores também ajuda a evitar enquadramentos indevidos que possam resultar em autuações, multas ou restrições futuras.


A atuação preventiva, portanto, deve ser entendida não apenas como uma proteção, mas como parte da gestão estratégica do patrimônio — especialmente para empresários e famílias com portfólios imobiliários diversificados.


7. Considerações finais


A inclusão das operações imobiliárias no campo de incidência do IBS e da CBS representa um novo marco regulatório para o setor. A figura do investidor pessoa física, antes distante das obrigações tributárias típicas das empresas, passa agora a ser vista sob uma ótica empresarial, com exigências próprias de um contribuinte ativo do sistema.


Compreender as novas regras, os limites de enquadramento e as oportunidades de planejamento não é apenas uma questão de conformidade legal, mas de inteligência financeira.


O futuro da gestão patrimonial imobiliária no Brasil será cada vez mais técnico e estratégico. Aqueles que adotarem uma postura proativa, com planejamento jurídico e tributário contínuo, estarão melhor posicionados para enfrentar o novo cenário, com segurança, previsibilidade e sustentabilidade de longo prazo.

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